segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

"Serei, disse que sim e pronto! Serei!"
Ela gritou ao vento, da janela do quarto da casa, do segundo andar. Mocinha rica, bonita moça, menina do campo; não quis ficar.
O pai ouviu, não quis saber. A mãe se viu desesperada aos dezesseis, voltou no tempo.
"tac tac tac tac"
Os sapatinhos de garota, da menina moça, descendo do segundo andar. Os olhos fúlgidos; perdidos no futuro palpável. As mãos tenras na bolsinha azul, com dinheiro para ir pro sul.
Foi-se a garota, menina ingênua, jovial.
A mãe chorava, estérica, nada fez. O pai morreu, mas há muito que morreu, por dentro ele se foi, então só não sentiu.
"vruum vrum vruuum"
Corria o carro, ela corria, a cidade inteira em seus olhos se perdia.
A alma jovem, a rara jóia, a que seria; se foi e perdeu.
Da janela do quarto do apartamento, do décimo quinto andar do prédio, ela gritou.
Ela gritou e ninguém ouviu.
Chorava a moça, desesperou. Se viu na mãe, não suportou.
Voltou à janela e não mais gritou.
Viu seu reflexo e pulou.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

eu quero, simplesmente quero

Eu quero um sorriso nos lábios
Quero um beijo no rosto
Quero o cheiro suave
Quero as mãos entrelaçadas
Quero a simplicidade dos fatos
E a beleza dos pequenos momentos
Eu quero a paixão de adolescente
Que me escapou pelos dedos
Quero a felicidade indecente de se sentir pertencido
Quero a falta de graça dos minutos primeiros
Quero a graça exagerada das piadas alheias
Quero o andar harmônico dos dois corpos chegados
E o fogo de um olhar enamorado
Eu quero que venha de repente
Que parta da amizade
E que cresça naturalmente

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

A vida é mais bela fora da janela

Eu olho agora para a janela e vejo meu reflexo. Ela permanece lá, na minha frente, estática.
Eu lembro dos meus dias de garota, quando ainda não reparava na janela. Eu corria, brincava lá fora, eu não precisava dela. Mas os anos se vão e nós somos obrigados a ir com eles. E eu me deixei ir.
Nem me lembro quando a toquei pela primeira vez.
Devia ter lá meus doze anos, inocente ainda eu era. Mas algo me chamou de dentro dela, então não pude evitar. Fui me aproximando e me entreguei. Provavelmente foi assim que se deu nosso primeiro contato.
Mas não era ainda algo que não se podia evitar, meu relacionamento com ela.
Me lembro que ela foi se abrindo aos poucos, cada dia que passava me via ainda mais perto dela. Estúpida eu fui, me deixei cair assim, agora não tem volta! Eu olho lá fora e vejo várias janelas, com várias pessoas trancafiadas dentro. Elas tomaram conta de nós. Mas há quem ache bom. Há quem diga que viver dentro de uma janela é a melhor opção; é parte da nossa evolução! Há quem diga ainda que a janela nos leva a outro mundo, onde podemos nos refugiar do homem. Mas o homem é parte essencial da janela, é por culpa dele que existe a janela. Sem o homem ela nada seria. Nós ajudamos a formar o sistema, tentando encobrir o homem, para que então pudéssemos criar janelas. Pensávamos que poderíamos controlá-las, mas acabamos escravos delas.
Vivemos trancados aqui, e não é bom; quem disse que felicidade é ver a vida passar pela janela? A vida real, aquela na qual podemos respirar o ar que sopra e rir, tocar, sentir; essa vida se dá fora da janela. É claro que não é segura, mas a janela também não é, ela é transparente, é frágil, te expõe, te maltrata até. A violência da qual tentamos escapar ao nos refugiar na janela, é facilmente vista através dela; e se espalha ao redor do mundo somente por causa dela. Nós acreditamos no que ela diz, compramos suas verdades falsas, seus fatos fingidos e suas crises ilusórias; encarnamos sua moda dissimulada, pensando ser arte; aplaudimos seus discursos traiçoeiros e nem notamos que estamos sendo manipulados. E pensar que eu a enxergo agora, que faço parte dela, que vivo para ela mais do que para qualquer coisa. Ela me tomou o dia, as noites, me roubou amigos, me tomou o tempo e ele eu não posso ter de volta.
É triste que fiquemos assim, limitados no pensar e no agir, é triste saber que, mesmo se eu abrir minha janela e deixar toda a vida entrar, ela não deixará de ser o que era. Quero ter forças para fechá-la para sempre, se não para sempre pelo menos por um dia ou dois; quero viver para o que existe aqui e agora, quero viver para quem vive, quem respira, quem tem o coração batendo junto ao meu; quero existir para quem me enxerga, quero ser uma peça útil, fora de qualquer janela.
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